*Os textos que seguem “a queda do herói”, “trocar as imagens dos fatos”, “os três poderes” e “o caso Watergate” foram baseados no livro “A Tirania da Comunicação” de Ignácio Ramonet (Ed. Vozes, 1999).
A queda do herói
Por Erick Paytl
Houve uma época em que o jornalista era visto como um herói. Ele era considerado aquele profissional que reparava de erros, denunciava as injustiças. Essa imagem do jornalista como um justiceiro, inclusive, serviu para influenciar o roteiro de muitas histórias de quadrinhos criadas no passado. Não é ao acaso o fato de muitas personagens de desenhos e filmes como o super-homem, Timtim e o homem-aranha serem jornalistas.
Infelizmente, surgiram alguns vilões que levaram toda aquela imagem heróica do jornalista esgoto abaixo. A concorrência entre grandes impérios comunicativos aliada ao fato de a informação tornar-se, antes de tudo, mercadoria, fizeram com que o jornalista “esquecesse” de seu comprometimento com a verdade dos fatos. Isso fez com que o profissional passasse a ser visto com desconfiança pelo público que, uma vez antes, o considerava como herói.
Essa queda do jornalista o levou a perder o objetivo prioritário de transmitir informações. A função agora era conseguir audiência custe o que custar - o jornalista podia mentir, criar histórias, “trocar as imagens dos fatos”, etc. Ele podia também usar um estilo mais emotivo, que tendesse a criar suspense e que se voltasse para um exagero de emoções, tudo para chamar a atenção do público. Foi daí que surgiu um jornalismo que teria mais a intenção de fazer as pessoas “chorarem” do que de informá-las, o tão conhecido jornalismo sensacionalista.
Ainda vale discutir a questão de que com o advento da internet, todo mundo pôde virar jornalista. Hoje, qualquer um pode transmitir informações para qualquer pessoa. De um ponto de vista isso é prejudicial, pois se uma pessoa desqualificada, despreparada, pode “ser jornalista”, como o público vai saber em que informações confiar? São muitos os sites que trabalham com informações erradas e mentirosas, muitos deles nem envolvem jornalistas.
“Trocar as imagens dos fatos”
Existe um ditado que diz “eu só acredito vendo”. Pois bem, mas o que comprova que aquilo que se vê é realmente verdade? Ou o que comprova que as imagens que vemos tem uma relação verdadeira com o que foi dito? O mundo de hoje é formado por uma sociedade cética que só acredita vendo e, mesmo assim, essa sociedade se torna alvo fácil para ser enganada por aqueles que dominam a informação assim como as técnicas de imagem. Dois exemplos esclarecem bem essa manipulação da informação que é feita por muitos jornalistas que optam trocar a ética para fazer matérias mais emocionantes, que surpreendam o público. Uma delas aconteceu em 1990, na Romênia, quando foram divulgadas as imagens atrozes do ossário de Timisoara que mostravam cadáveres alinhados sobre lençóis brancos. Esses cadáveres, tidos como vítimas de um massacre em dezembro de 1989 durante a ditadura, eram na verdade corpos de pobres que foram desenterrados de um cemitério e cedidos a TV. Outra das várias estratégias de manipulação de imagens aconteceu em 1998 com a ajuda de um programa chamado Paintbox, conhecido por alterar imagens. A capa do Paris Match continha uma foto de Caroline de Mônaco e de Ernst de Hanovre juntos e sozinhos, como se fossem um casal íntimo. O caso foi desmascarado: na verdade, a foto original continha um grupo de pessoas e mostrava, entre Caroline e Ernst, uma amiga deles que o Paris match tinha simplesmente feito sumir na foto junto com as demais pessoas. Voila! Tinha-se assim criado uma matéria digna de capa!
Os três poderes
Até os anos 70/80, a imprensa era tida como um “quarto poder”, que podia contrariar os abusos dos três outros poderes – o executivo, o legislativo e o judiciário. Hoje, a imprensa está num outro tipo de classificação que leva em conta também três poderes separados hierarquicamente de acordo com sua intensidade. O primeiro deles é o poder econômico, o segundo é o poder midiático e o terceiro, o político. Muitos acreditam que o poder político está em segundo lugar, mas isso não pode ser mais afirmando, pelo menos hoje depois do caso de Watergate em que a imprensa conseguiu derrubar o homem mais poderoso do mundo na época - o presidente dos EUA, Richard Nixon. A informação hoje é tão poderosa que muitos correm na disputa para manipulá-la. Trabalhar com ela não é fácil e exige cuidado, pois a informação é uma arma capaz de derrubar qualquer um, seja uma pessoa digna ou não.
Infelizmente, muitas pessoas trazem consigo a idéia de que “boatos podem não ser verdadeiros, mas se foram contados é porque há alguma verdade”, isso torna a informação ainda mais poderosa nas mãos de quem a tem, vai da pessoa detentora de manipular informações ficar do lado da ética ou optar em criar estórias que atendam aos seus interesses.
Quem opta por criar estórias não faz jornalismo, não é jornalista, é apenas como se fosse um vírus que penetra na profissão para tirar proveito. Felizmente, muitos jornalistas são muito comprometidos com a verdade e brigam para manter a ética e a moral na profissão. São estes profissionais que reanimam a imagem do jornalista heróico e que trabalham sempre para realizar a missão fundamental da mídia que é esclarecer e enriquecer o debate democrático.
O caso Watergate*
“Esta desconfiança em relação a mídia em seu conjunto é relativamente nova. [...] no final dos anos 80, esta desconfiança não existia globalmente [...] alias, há pouco tempo, creditava-se a imprensa uma capacidade bastante espetacular de revelar as disfunções da política. O caso Watergate (do nome do imóvel de Washington onde foram descobertos micros dissimulados pelos republicanos) mostrou muito bem, nos anos 70, que dois simples jornalistas, Bob Woodward e Carl Bernstein, de um jornal serio, sim, mas não dominante, o Washington Post, podiam derrubar o presidente dos Estados unidos, Richard Nixon. [...]a maioria dos jornais pelo mundo afora, em particular nos grandes paises desenvolvidos e democráticos, tentaram imitar o tom e estilo jornalístico, valorizado por ocasião por ocasião do Watergate. Admitia-se que jornalistas, armados da verdade, pudessem opor-se a dirigente políticos”.
[Carl Bernstein disse]: “No Watergate, tínhamos um caso de abuso de poder sistemático e que se espalhava por toda parte. Um presidente dos estados unidos havia utilizado sua função para desviar o processo democrático: ordenava escutas telefônicas, assaltos, incêndios e espancamento de manifestantes. Jamais houve nada comparável em nossa historia. Nem antes, nem depois de Nixon”.
*trechos tirados inteiramente do livro “A tirania da comunicação” (p. 42 e 43).
Imagens: http://www.vermelho.org.br/admin/img_upload/Ramonet_entr.jpg
http://1.bp.blogspot.com/_mYxsY8QSXmU/SXYuNBtAc8I/AAAAAAAAAYs/OrO3GG0hjAQ/s400/79368.jpg
“A Tirania da Comunicação”
Bruno Rossi
Com o advento dos novos meios de comunicação e com a revolução capitalista, Ignácio Ramonet em seu livro “A Tirania da Comunicação” mostrou o quanto houve mudanças no setor informativo, retratando a postura do jornalismo desde a década de 80 e falando sobre o “ser jornalista de hoje”.
Ele abordou assuntos diversos sobre a crise da mídia e a falta de compromisso com a verdade por parte das empresas jornalísticas que vivem uma grande concorrência. Ramonet também tratou de alguns elementos dessa crise midiática. Um deles é a superinformação, na qual cita como exemplos o caso Clinton-Lewinsky e a morte de Lady Di, ambos os casos que ecoaram de forma extremamente intensa pela mídia na época em que se sucederam. Outro elemento é a chamada “censura democrática”, termo que se dá pela saturação de informações que os jornalistas são submetidos periodicamente, comprometendo a transmissão de informações que acabam chegando ao público de forma menos apurada e gerando o risco de possíveis erros de informação.
O autor ainda relaciona a imprensa como uma fonte de poder que, até certo tempo, questionava outros poderes (legislativo, executivo e judiciário) mantendo o controle democrático e que, apesar de ainda poderosa, hoje sofre com a perda de credibilidade, após uma série de publicações falsas, principalmente divulgadas durante os anos 80.